Theresa Catharina de Góes Campos

  AMORES DIVIDIDOS

Produzido por Samuel Jackson, que também protagoniza o filme, ao lado de Lynn Whitfield e Debbi Morgan, "Amores Divididos" (Eves´ Bayou - EUA, 1997- de Kasi Lemmons- 109 min.) é um drama familiar contado em linguagem poética, num clima de superstições e magia negra.

Destaque para a produção e direção; a fotografia de Amy Vincent, envolvente desde a apresentação dos créditos iniciais; o roteiro; e a trilha sonora de Terence Blanchard.

"A memória é uma seleção de imagens. Algumas fugidias, outras impressas indelevelmente no cérebro".

A história se passa em Louisiana, na década de 50, e todos os personagens são negros, num contexto de cultura crioula, afro-americana. O pai, médico endinheirado e mulherengo, regularmente infiel, reconhece ter "a esposa mais linda e perfeita - uma dama". Os três filhos - duas meninas e um garoto - convivem sob a disciplina carinhosa da mãe, entretanto, se ressentem da ausência freqüente (até aos domingos) do chefe da família.

Os acontecimentos são narrados por Eve, menina de dez anos, já consciente, embora amedrontada com isso, da existência de uma realidade espiritual atuando no mundo visível, material. A visão feminina domina o roteiro com originalidade. Há beleza, profundidade, emoções dinâmicas, num constante turbilhão de complexidade. Os questionamentos "contam" a história, com elementos da cultura regional.  A tia Mozelle, que faz "leituras psíquicas", tenta amenizar as mágoas/dores do clima familiar, assegurando à cunhada que, num dia futuro, seu irmão deixará de procurar o que ele já tem a seu lado, sem ver... As duas mulheres consultam uma "sacerdotisa de vudu", assustando-se com algumas das previsões.

A menina Eve presenciou cenas impróprias do pai com a Sra. Moreau,
casada com um amigo dele. A irmã adolescente está passando por uma fase difícil nos relacionamentos familiares.
Amor, ciúme, solidariedade, raiva, sexualidade adolescente/adulta...sentimentos/realidades presentes no roteiro; às vezes, são circunstâncias confusas, emoções tão misteriosas em suas manifestações como a paisagem enigmática clara-escura, árvores-lama dos pântanos locais. Para decifrar as dúvidas, alcançando a verdade, será preciso buscar uma luz especial: a do coração inquieto, dolorosamente vivo.

A diretora declarou sua intenção de registrar "esse drama muito íntimo e humano, e colocá-lo tendo, como pano de fundo, o universo fantástico da imaginação de uma garota e o folclore mágico de Louisiana".
O público se mantém com dúvidas sobre os personagens, suas ações e os acontecimentos, do início ao fim do filme, compactuando com o suspense emocional da trama.

A cena final é bela na estética e no conteúdo afetivo.

Nos EUA, "Amores Divididos" foi considerado "o melhor filme independente de 1997".

Theresa Catharina de Góes Campos

Obs. Assisti ao filme no cinema, mas pode ser encontrado em vídeo (PlayArte).
 

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