Nossa língua portuguesa

Correio Braziliense

Brasília, terça-feira,

08 de janeiro de 2002

Micros & Cia

Felipe Campbell

felipe@correioweb.com.br

Nossa língua portuguesa

Escrever sobre tecnologia, para quem gosta do ofício, é sempre um prazer. Acompanhar as novidades eletrônicas que rolam nos quatro cantos do mundo e viajar em cima de idéias que possam virar matérias interessantes faz parte do trabalho de qualquer jornalista que cobre a área de informática. Mas há uma preocupação simples que nunca deve ser esquecida por qualquer pessoa que está trabalhando em um grande veículo de comunicação brasileiro: a preservação da língua portuguesa. O assunto já foi abordado nessa coluna algumas vezes ao longo dos últimos anos - inclusive pelo nobre colega Fabricio Rocha na última edição -, mas é preciso insistir em aniquilar certos vícios antes que eles virem moda. Há coisas publicadas por aí que doem nos olhos, nos ouvidos e até dão calafrios na espinha. Não há como evitar que, dentro de ambientes corporativos, as pessoas sacramentem o uso de palavras e expressões tão desnecessárias quanto ridículas e vazias de significado em português como benchmarking, peer to peer, system engineer, case e billable, só para citar algumas. Mas, se os jornalistas se dignassem a não complicar o que não é complicado, as coisas ficariam muito mais fáceis de serem entendidas. E conseqüentemente mais acessíveis para qualquer pessoa que se interessa por informática e economia, mas não é especializada no assunto. Posso morder minha língua porque, afinal de contas, ninguém é perfeito. Mas a minha parte eu prometo fazer.

Case?

Dando início à campanha ''mate o complexo de vira-lata que há dentro de você e do seu amigo'', sugiro fazermos um extermínio em massa da malfadada palavra case. O case nada mais é do que um caso. Não um caso amoroso ou coisa do tipo. Mas um reles caso acontecido com alguma empresa ou pessoa. Vamos citar como exemplo de fracasso o caso dos provedores gratuitos. Para que case? Não pague mico. Detone o case.

Matem todos eles

Não tenho a pretensão de dar aulas de português, como faz nossa querida professora Dad Squarisi, mas me reservo ao direito de condenar à cadeira elétrica expressões como customer relationship management, market share, end user e os famigerados cargos de executivos em empresas (chief executive officer, sales manager). Em vez disso, para ser simples e direto, é melhor usar, respectivamente, gerenciamento de relações com o cliente, fatia de mercado, usuário final, chefe executivo e gerente de vendas. É difícil? É feio? É complicado? Definitivamente não.

Neologismos

Piores ainda são os neologismos, coisa, com todo o (des)respeito, criada por quem tenta fazer uma média com o estrangeirismo. O resultado é grotesco: uma aberração da natureza que acaba virando expressão comum nos jornais - repito: não dá para fazer nada com relação ao vocabulário corrente entre os empresários, mas é meu dever e de todo jornalista que se preze zelar pela língua portuguesa. O que mais irrita é que não há nem a desculpa de que no português não há palavra equivalente. Conversa mole. Vejam exemplos claros: dou um doce de coco recheado com chocolate para quem me citar um caso único em que seja possível usar o famigerado disponibilizar e não dê para usar oferecer. O mesmo vale para customização e personalização; atachar e anexar; deletar e apagar; salvar e gravar.

Sendo razoável...

É compreensível até certo ponto que a gente use mouse em vez de rato para designar o pequeno aparato utilizado para acessar os menus do sistema operacional. Apesar de em países de língua espanhola ser comum falar ratón em vez de mouse, não dá para traduzir tudo. Mas, já diz Arnaldo César Coelho, a regra é clara: se existe termo em português que explica com a mesma precisão o que quer ser dito em inglês, usemo-lo. Não dói e uma legião de admiradores da língua portuguesa e leitores agradecerão.

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