Uma floresta reconstruída

Correio Braziliense

Brasília, domingo,

27 de janeiro de 2002

Uma floresta reconstruída

Livro conta como o Parque Nacional da Tijuca foi salvo do desmatamento, ao mesmo tempo em que alerta sobre os riscos da destruição ambiental.

Cristina Ávila

Da equipe do Correio

''O fundador do Rio de Janeiro, Estácio de Sá, cometeu um erro em 1565. Aquele não era o lugar certo para se fazer uma cidade. Muito menos uma cidade com oito milhões de habitantes. O Rio tinha todos os requisitos para ser declarado, logo na descoberta, um parque nacional. É claro que os fundadores quinhentistas não poderiam pensar nisso. Idéias como a dos parques nacionais só ocorreriam à humanidade muito tempo depois. Exatamente 300 anos mais tarde. E a cidade acabou se instalando.''

O texto é do livro Parque Nacional da Tijuca, 140 Anos de Reconstrução de uma Floresta. Com 147 páginas, foi escrito pelo jornalista Marcos Sá Corrêa, editor do site de notícias no.com.br; pelo pesquisador Gustavo Martinelli, do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro; e por Pedro da Cunha e Menezes, cônsul-adjunto do Brasil em Sydney, Austrália, ex-diretor do parque. As fotos são de Ricardo Azoury. A obra ao mesmo tempo é uma exposição das belezas cariocas e um alerta sobre os riscos de destruição ambiental.

Os autores contam como o parque se transformou em uma das maiores florestas urbanas do mundo, oficialmente decretado em 1961, com 3,2 mil hectares. O Parque Nacional da Tijuca esperou mais de 100 anos por esse título, desde que o governo imperial começou, em 1856, a comprar nos morros que coroam a cidade os sítios e as fazendas que seriam reflorestadas. O Ministério da Viação e Obras Públicas gastou 218 contos de réis para desapropriar uma pequena extensão de matas e enormes áreas devastadas, onde foram plantadas mais de 80 mil mudas de árvores nativas.

Gustavo Martinelli diz que as florestas tropicais são reconhecidas como o maior habitat do mundo de espécies de animais e de plantas. O total de espécies da Terra ainda é desconhecido, algo em torno de 1,7 milhão de organismos descritos cientificamente. E mais da metade está nos trópicos, especialmente nas florestas tropicais. Por isso, o futuro das florestas tropicais é tido como uma das maiores questões ambientais para esta década. Ele está intrinsecamente ligado ao futuro do planeta.

''É alarmante a destruição das florestas tropicais, cresce a cada ano. Podemos estar diante da última oportunidade para deter essa acelerada destruição. E, se ainda nesta década não forem encontradas alternativas, o mundo vivenciará uma catástrofe ecológica de conseqüências globais''. Martinelli diz que pesquisas mostram evidências de que a destruição contínua de florestas tropicais pode interromper o ciclo da água e carbono na atmosfera, ocasionando mudança climática no planeta.

"Podemos estar diante da última oportunidade para deter essa acelerada destruição. E, se ainda nesta década não forem encontradas alternativas, o mundo vivenciará uma catástrofe ecológica de conseqüências globais'' Gustavo Martinelli Pesquisador do Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro

SERVIÇO

Parque Nacional da Tijuca - 140 Anos da Reconstrução de uma Floresta

Textos de Marcos Sá Corrêa, Gustavo Martinelli e Pedro da Cunha Menezes

Fotografias de Ricardo Azoury Editora Ouro Sobre Azul, 147 páginas, R$ 120

Quando a mata era um estorvo

Os primeiros europeus chegaram ao Rio de Janeiro no início do século 16. A
orla da Baía de Guanabara era ocupada por duas dezenas de aldeias indígenas, com entorno atulhado de madeiras da melhor espécie. Era também local de porto privilegiado para atender às necessidades de matéria-prima de duas atividades fabris que despontavam na Europa: a indústria naval e a tecelagem. O pau-brasil rendia excelente tintura para dar cor aos tecidos, e as árvores duras e resistentes eram o que havia de melhor para a construção naval. Assim começou o desmatamento.

Pedro da Cunha Menezes conta que a Tijuca era um estorvo. Além de entrecortar a cidade, dificultando a comunicação, tinha terreno pantanoso e exíguas baixadas livres para plantar e manter rebanhos. A degradação, então, se manteve estável até a descoberta de ouro em Minas Gerais, no final do século 17. Minas não era capaz de suprir os milhares de aventureiros com animais de carga e alimentos. O Rio passou, por isso, a ser centro produtor e exportador dessas mercadorias.

Com a corrida ao ouro, a população começou a crescer. Mas a explosão demográfica iniciou-se mesmo em fins de 1808, com a chegada da família real. A Floresta da Tijuca jamais seria a mesma. Chegaram nobres, comerciantes, fazendeiros e ocuparam as matas. O reflorestamento foi empreendido entre 1861 e 1888. O principal motivo foi a proteção dos mananciais de água que abasteciam a cidade. (C.A.)

Resta pouco

A Mata Atlântica sofre pressão dos maiores centros industriais e da maior parte da população do Brasil. De sua área original de aproximadamente 1,4 milhão de quilômetros quadrados, 8% da área total sobrevive, e somente de dois a três por cento apresentam chances de salvamento. Ao todo, 16% do território brasileiro, distribuídos em 17 estados. Os restos de floresta apresentam-se espalhados ao longo da costa, com perdas incalculáveis de espécies de plantas e animais. Entre 1985 e 1995, mais de 1 milhão de hectares foram desmatados em dez estados. (C.A.)

© Copyright CorreioWeb Fale com a gente Publicidade