''Qual é a sua opinião sobre os planos de combate à violência?''

Correio Braziliense

Brasília, domingo,

20 de janeiro de 2002

Receitas de um Pediatra

Dr. Márcio Lisbôa

''Qual é a sua opinião sobre os planos de combate à violência?''

Fernando Joaquim - Plano Piloto

''Mais dinheiro, pouco resultado'', diz, em manchete, o Correio Braziliense. ''Mesmo com a ajuda do Governo Federal, secretarias de Segurança do Distrito Federal e de Goiás não conseguiram reduzir índices de violência no Entorno''. Na mesma edição, existe um relato aterrorizador sobre a situação de violência na capital do país. Pelo visto, o Plano Nacional e os dois estaduais dedicados ao combate à violência não deram resultado. Acredito que o terceiro plano, recentemente lançado em Brasília, irá pelo mesmo caminho.

Na tarde do dia 20 de junho de 2000, o presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou a implantação, em todo país, do Plano de Combate à Violência, que prometia: desarmar a população com a suspensão do registro de armas em todo território nacional; repassar R$ 320 milhões, em 2000, e R$ 500 milhões, em 2001, para reequipar a polícia; desbloquear verbas do fundo penitenciário, para a criação de mais 25 mil vagas nas penitenciárias estaduais e para o treinamento de agentes; criar 25 delegacias da Polícia Federal em 2000 e aumentar seu efetivo, com a abertura de duas mil vagas e o preenchimento de 461; repassar R$ 20 milhões para os estados fronteiriços, para melhorar a vigilância nas fronteiras; repassar à Relux R$ 450 milhões até 2002, para melhorar a iluminação pública; promulgar medidas legislativas; investir R$ 80 milhões em ações sociais preventivas, para a formação de lideranças comunitárias jovens, fortalecer núcleos familiares.

Os resultados do Plano? O número de crimes contra a pessoa no Brasil subiu nos últimos dois anos, segundo o Ministério da Justiça, de 984.721 para 1.131.120. Pode-se alegar que houve problemas, principalmente na liberação de verbas, para o cumprimento das promessas. Tenho absoluta certeza de que os bandidos continuariam a ser fabricados, mesmo que fossem dobradas as verbas, e a violência continuaria a aumentar. O governador do DF, durante a campanha eleitoral, defendeu a implantação em Brasília do plano Violência Zero, nos moldes do existente em Nova York. Ao assumir, em 1999, lançou o Segurança sem Tolerância.

Como todos os planos contra a violência, foi aceito com grandes esperanças. As promessas eram muito semelhantes às do Plano Nacional, o que me levou a comentar, nesta coluna, a minha descrença sobre os resultados. O fracasso levou ao lançamento do segundo plano: Segurança em Ação. As propostas, como as dos planos anteriores, se restringiam praticamente à tomada de medidas para a repressão, tais como vigiar, ameaçar, processar, punir, prender. Prevenir e educar não estavam entre elas. Aliás, são chamadas erroneamente de medidas preventivas a colocação de policiais nas ruas, viaturas para a polícia, criar delegacias, distribuir cartilhas, melhorar a iluminação, etc, que, logicamente, não têm nada a ver com a prevenção da formação de delinqüentes.

Como era de se esperar, o segundo plano não funcionou e agora, início de 2002, será lançado o terceiro, cujo destino, a meu ver, será igual ao dos dois primeiros, pois continua não privilegiando a prevenção. O terceiro plano se propõe a concluir o Setor C da Penitenciária da Papuda e uma nova delegacia em Planaltina; criar uma central integrada para as polícias Militar, Civil e Corpo de Bombeiros; criar duas delegacias especializadas e a Divisão de Repressão a Seqüestros; organizar equipes específicas em todas as delegacias, para investigar o tráfico de drogas e a criação do Centro Piloto de Prevenção às Drogas; concurso público para contratar 1,6 mil policiais militares e a criação de uma companhia militar na Estrutural.

O novo plano tem ainda como meta intensificar o combate aos seqüestros-relâmpagos, assaltos a bancos e crimes pela Internet. Em síntese, esse plano se assemelha aos anteriores, pois o trabalho de repressão continua prioritário, sem uma linha de como se evitar a formação de delinqüentes.

O fato foi reconhecido pelo ex-assessor técnico da Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, George Felipe Dantas: ''A compra de armas, o aumento do efetivo policial, a construção de novas delegacias e a modernização dos órgãos de segurança são medidas que não estão voltadas para o problema da criminalidade''. As causas responsáveis pelo aumento do número de delinqüentes são conhecidas, preveníveis, e nada têm a ver com as propostas dos planos de combate à violência. Paradoxalmente, quanto mais ''planos'' são implantados, mais aumenta a violência, mais Brasília está se tornando um faroeste.

A formação de indivíduos que não aceitem ser traficantes ou usuários de drogas é o caminho correto. A maior frustração de minha vida é não conseguir convencer as autoridades que, embora as medidas preconizadas para o combate à violência sejam importantes e válidas, elas não atingem o cerne do problema. Somente a aplicação de recursos nos cuidados e educação das crianças, contribuindo para a boa formação de sua personalidade, do seu caráter e de sua moral, para que elas se tornem pessoas honestas e úteis ao nosso país, poderá impedir a crescente escalada da violência.

Continuarei escrevendo sobre a prevenção da violência nos próximos artigos, pois, em verdade, se trata do mais importante problema pediátrico da atualidade.

Cartas para o dr. Márcio Lisbôa devem ser enviadas para Correio

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