A DRAMATIZAÇÃO COMO FORMA DE COMUNICAÇÃO: TEATRO E CINEMA Theresa Catharina de Góes Campos* O teatro na Antigüidade Teatro é uma forma literária e também uma comunicação ao vivo, do autor para o público. De uma geração a outra geração. De uma época para outra época. Comunicação de uma circunstância à mente do espectador e, às vezes, um toque especial para o seu coração. O teatro constitui um processo sistemático de comunicação audiovisual. Destacou-se sobretudo na Grécia, com Sófocles, Píndaro, Ésquilo,Eurípedes. Popular, o teatro grego caracterizou-se pelo seu conteúdo altamente intelectual. A famosa tragédia "Electra" foi representada pela primeira vez mais ou menos em 413 antes de Cristo, no teatro de Dionisos, com capacidade para trinta mil espectadores, sentados em arquibancadas semicirculares escavadas na rocha das encostas da Acrópole de Atenas. O povo grego soube amar as suas Tragédias, que legou à humanidade. As peças de Sófocles e Eurípedes, os dramas de "Antígona", de "Édipo Rei", exerciam grande atração sobre o público. Antígona comunicou aos espectadores, para todo o sempre, sua mensagem de justiça; preferiu arcar com a ira e a violência do poder terreno, a violar uma lei religiosa; não vacilou ante a defesa dos princípios em que acreditava. Foi essa a sua mensagem universal. No Egito, as peças teatrais encenadas ao deus Osíris simbolizam as quatro estações do ano. O teatro na Idade Média Na era medieval, dois lugares exerceram destacada função na vida do povo: as igrejas e as praças. O teatro existia nesses dois locais.No primeiro, representavam-se peças religiosas, versando sobre temas sagrados, extraídos da Bíblia ou de lendas piedosas. Mas o teatro viu o seu público aumentar quando saiu dos templos e passou a ser apresentado nas praças; embora as peças tivessem sempre uma atmosfera religiosa, o tema era um pouco mais livre; chamavam-se peças "profanas". Uma delas tinha o nome de "sottise" - palavra francesa que significa "tolice", "loucura". Todas os personagens fingiam ser loucos e diziam todas as verdades que desejavam falar, sem que fossem presos ou perseguidos, pois estavam, para todos os efeitos, "representando". Essas peças satíricas agradavam bastante o público. Nos papéis de loucos, os atores podiam dizer o que os espectadores não ousavam. O teatro medieval floresceu sobretudo na França e começou com as representações sacras, organizadas pelo clero para difundir os episódios religiosos mais interessantes. Nesse teatro, destacamos: os dramas litúrgicos, os milagres, os mistérios, a "sotie". Os dramas litúrgicos representavam-se após a Missa, nos dias das grandes festividades, tendo como tema principal as cenas do Natal, da Paixão ou da Ressurreição de Cristo. No século XII, os Milagres substituíram os dramas litúrgicos. Nessa nova forma, os versos dão lugar à prosa e o latim vê-se preterido pelo francês. Além disso, os autores já não eram apenas sacerdotes, mas leigos, e as representações passaram a ser realizadas no adro das igrejas, abandonando o interior dos templos. Uma outra característica distingue os Milagres: enredos profanos, embora de significação ou fundo moral. O teatro religioso da Idade Média atingiu o seu clímax no século XV, quando apareceram os Mistérios, apresentados nas praças. As cenas da história bíblica, assunto principal, viam-se intercaladas com episódios cômicos - as farsas - , o que evitava a monotonia dos espetáculos, geralmente muito longos. O teatro da Idade da Idade Média refletia a atmosfera medieval,de cunho religioso.Nas igrejas ou nas praças, o povo assistia aos Mistérios, aos Milagres, às farsas, caracterizando-se como uma dramatização de fontes bíblicas. A própria "Divina Comédia", de Dante,foi uma obra poética com características de teatro, e marcada também pela visão das coisas divinas. O teatro da Idade Moderna O teatro da Idade Moderna teve nomes gloriosos: Shakespeare,Corneille, Molière e Racine. Shakespeare escreveu, entre outras peças: "O Rei Lear", "O Mercador de Veneza", "Ricardo II", "Ricardo III", "Romeu e Julieta", "Hamlet", "Otelo", "Júlio César", "Macbeth", "Antônio e Cleópatra". A tragédia de dois jovens apaixonados, Romeu e Julieta, comunica-nos até hoje o absurdo que representa a discórdia, o ódio entre os homens, que lutam cegamente uns contra os outros... e a visão do amor, que vê além de todas as diferenças aparentes e busca a unidade de coração. A mesma força do amor, de ser capaz de unir, quando tudo parece conduzir à desunião, está presente na peça de Corneille "Le Cid". Enquanto Corneille pintava os homens como deveriam ser - cumpridores de seu dever, heróicos, altruístas - Racine os descrevia bem mais humanos, com seus defeitos peculiares. São peças famosas de Racine:"Berenice", "Fedra", "Ifigênia". Com "O Mentiroso", Racine contribuiu para o desenvolvimento da comédia, chegando mesmo a influenciar as obras de Molière. O espírito satírico de Molière registrou para a posteridade o ambiente de sua época, com suas futilidades e seus defeitos, por meio de peças teatrais como: "Tartufo", "Don Juan", "O Burguês Fidalgo", "As Mulheres Sábias", "O Doente Imaginário", "As Preciosas Ridículas","Escola de Maridos", "Escola de Esposas". Hoje, o público ainda ri do Burguês Fidalgo que, recebendo um título, quis se assemelhar aos membros da nobreza - e contratou professor de dança, de Filosofia, encomendou ao alfaiate uma roupa de fidalgo, etc. Mas isso foi uma realidade - aos burgueses ricos, em troca de dinheiro, os reis davam títulos, o que não impedia que eles continuassem sendo o que sempre foram: burgueses. Na França de Molière, as mulheres se reuniam em sociedades literárias, onde se portavam com refinada afetação. O autor criticou a superficialidade, as mulheres fúteis que desejavam aparentar um espírito intelectualizado; daí surgiu a sua comédia "As Mulheres Sábias". As óperas de Wagner Os apreciadores da música e das óperas de Wagner constituem uma prova eloqüente de que o gênio alemão conseguiu se comunicar. Sua obra foi uma ponte entre ele e os outros homens - incapazes de criarem música semelhante, mas capazes de entendê-la e amá-la. Os aplausos de ontem confundem-se com os aplausos de hoje para as obras de Wagner: "O Navio Fantasma", "Lohengrin", "Os Mestres Cantores", "Tristão e Isolda", "Parsifal". Assim, o teatro comunica gerações. O teatro contemporâneo O autor norueguês, Ibsen, é considerado o mais importante dramaturgo do século XIX. Quando começou sua carreira, a literatura da Noruega, que durante séculos estivera ligada à dinamarquesa, iniciou sua independência com um movimento de romantismo nacional, de que Ibsen também participou. Escreveu, entre outras peças: "Os Espectros", "Um Inimigo do Povo". "A Aliança da Mocidade" constitui uma sátira aos costumes eleitorais da Noruega de então. "As Colunas da Sociedade" aborda um caso de seguros fraudulentos, demonstrando que os burgueses ricos e poderosos podem ter um passado criminoso. Sendo essa uma peça otimista, o culpado se arrepende no final, é perdoado, e manifesta a sua confiança nas forças libertadoras e purificadoras do operário e da mulher. Mais tarde, Ibsen desistiu de se bater em prol do operariado, mas continuou seguindo uma linha feminista. Na peça "Um Inimigo do Povo", um médico sofre perseguições porque revelou que as águas de um balneário famoso estavam poluídas. O Irlandês Bernard Shaw, com muita ironia, escreveu: "Pigmalião", "Santa Joana", "César e Cleópatra", "O Herói e o Soldado". O público entende com facilidade a comunicação que lhe é feita através de Pigmalião - o homem que consegue fazer de uma mulher comum uma dama admirada por todos. Em "O Cerejal", Tchekov comunica o ambiente com as seguintes palavras: "Um campo. Uma velha capela, há muito abandonada, com paredes rachadas; próximo, um poço, grandes pedras, que aparentemente foram lajes tumulares, e um velho banco. Pode-se ver uma estrada para a propriedade de Gaev. De um lado erguem-se álamos, projetando suas sombras; o cerejal começa aí. À distância uma fila de postes de telégrafo; e longe, muito longe, em traços apagados no horizonte, uma grande cidade, visível apenas quando o ar é bastante límpido. Em breve,o sol desaparecerá." Jean Cocteau reconstituiu, no teatro contemporâneo, mitos antigos: "Orfeu", "Antígona", "Édipo". Autor também de "Les Enfants Terribles" e de "A Máquina Infernal", afirmou sobre a sua peça "Les Mariés de la Tour Eiffel": "A ação de minha peça desenrola-se através de imagens.................... As cenas estão integradas como as palavras de um poema." Na Espanha, Garcia Lorca, autor de "Bodas de Sangue", conseguiu comunicar a seu próximo, com lirismo e poesia, o sofrimento de "Yerma", a esposa que ansiava ardentemente por um filho. E não comunicou apenas isso; transmitiu ainda, na mesma peça, as superstições da população rural, a maledicência, os preconceitos. Pirandello ficou célebre pela sua teatralidade desesperada.Prêmio Nobel de 1934, suas comédias tratam dos enganos permanentes do homem. São tragicomédias que tratam dos enganos permanentes do homem. Não se trata mais de "palco", mas da própria vida, dizem os críticos. As personagens são pessoas vivas, que encontramos na rua, que conhecemos, que são nossos vizinhos. Pirandello escreveu: "Seis Personagens em Busca do Autor", "Mas não é uma Coisa Séria", "Henrique IV", "Vestir os Nus". Em "Vestir os Nus", uma suicida, depois que é salva da morte, deseja assumir outra personalidade, para conseguir enfrentar o mundo.A mesma fuga da realidade encontramos em "Henrique IV" - um louco consegue se curar, entretanto, acha mais fácil continuar a agir e se passar como "louco", a ter que encarar de frente o mundo em que vive. Laura é a personagem frágil, tímida, receosa de todos, na peça "À Margem da Vida", de Tenessee Williams. Ela e sua mãe são duas pessoas frustradas e agem com muito pouca compreensão, no que se refere a Tom,rapaz com alma de poeta, obrigado a ganhar a vida trabalhando numa sapataria, respectivamente seu irmão e filho. Complexada devido a um defeito físico, Laura não foi preparada para enfrentar o mundo.O grande sonho de sua mãe é lhe "arranjar" um bom casamento. Como vemos,as personagens são nossos companheiros de existência, com seus problemas e preocupações. Dramaturgo de inspiração vigorosa, Tennessee Williams deu notáveis contribuições ao teatro contemporâneo: "Um Bonde Chamado Desejo", "Noites de Iguana", "Gata em Teto de Zinco Quente", entre outras peças. Tennessee Williams, como Odets, apresenta um teatro poético baseado no realismo moderno, sem exigir uma participação mais livre e mais direta por parte do público (como ocorre com o teatro de Obey). Os conflitos e preconceitos raciais, que tantas lutas provocam entre os homens, nos são comunicados também pelo teatro contemporâneo. Exemplo disso são as peças "Oração Por Uma Negra", de William Faulkner, e "A Prostituta Respeitosa", de Jean-Paul Sartre. O existencialismo de Sartre, difundido e refletido em suas obras, não admite uma solução para a angústia do homem, o que se contrapõe ao pensamento de outra corrente existencialista. De acordo com o católico Paul Claudel, o homem realmente é um ser angustiado.Essa angústia, contudo, leva o ser humano a buscar Deus. No encontro do homem com Deus, ocorre a realização humana e a destruição da angústia. E toda a nossa vida é um caminhar para Deus. Sartre escreveu ainda para o teatro: "As Moscas", "Os Mortos Sem Sepultura". A história dessa peça gira em torno de um grupo da Resistência Francesa, aprisionado e torturado com requintes de crueldade. Paul Claudel, inspirado pelo seu existencialismo da esperança, escreveu a belíssima peça de teatro "O Anúncio Feito a Maria", cuja mensagem pode assim ser traduzida, de acordo com as palavras do próprio autor: "De que vale a vida, se não é para ser doada? Tendo abordado o aspecto religioso, nas considerações sobre autores teatrais, não podemos deixar de citar "Crime na Catedral", de Elliot. Entre as peças desse dramaturgo ("Crime na Catedral", "A Rocha", "Reunião Familiar") destaca-se de modo especial a primeira, que supõe um público cristão. Escrita por um poeta metafísico por excelência, expõe o paradoxo do martírio: lamento e júbilo, viver e morrer ao mesmo tempo; o mártir assumindo o papel de semente sangrenta da Igreja. "Crime na Catedral" é a única peça moderna onde o coro faz parte do esquema dramático, nele desempenhando um papel em muitos aspectos semelhante ao coro de Sófocles, ao expressar em música e imagem o sofrimento de Thomas. É o coro que lhe revela a razão de seu martírio: a caridade, o amor. Assim, a perfeição cristalina do coro deve-se ao fato de existir primeiramente para expressar um sofrimento, e apenas secundariamente para representar "as muralhas de Canterbury". A causa formal de "Crime na Catedral", de Elliot, e a chave para o enredo, para o uso do palco, para a estruturação de personagens e para o tratamento do texto, é a idéia de ação expressa pela fórmula: "Sabeis e não sabeis que agir é sofrer e o sofrimento é ação". Um jovem autor conseguiu grande êxito junto ao público de teatro - Edward Albee - com duas peças de um ato: "A História do Zoológico" e "O Sonho Americano"; e ainda: "Quem tem medo de Virgínia Woolf?". Suas obras batem numa mesma tecla dominante: a incomunicabilidade humana; apesar da tremenda necessidade que os seres humanos sentem de se comunicarem, mostram-se incapazes. E não se entendem, e se injuriam, e se magoam mutuamente. "Quem tem medo de Virgínia Woolf" mostra o desentendimento conjugal. "O Sonho Americano" é um verdadeiro pesadelo. Pena que o autor acentue tantos aspectos negativos, sem dar nem ao menos uma visão de esperança ou solução. Talvez, na busca de se apresentar com dramaturgo realista, foi tão pessimista que perdeu o senso da realidade. Esqueceu a ternura, a solidariedade humana. Deteve-se, fixou-se na incompreensão. Edward Albee, o autor da incomunicabilidade, conseguiu se comunicar com as platéias - e teve êxito, justamente porque os espectadores compreenderam o que ele escreveu, captaram o significado de sua mensagem. Antecedentes do cinema A História do Cinema, um dos mais notáveis instrumentos de comunicação, iniciou-se há sete mil anos. A análise do movimento foi tentada nas pinturas das grutas pré-históricas de Altamira, na Espanha. E a projeção de sombras numa parede já era praticada pelos chineses há cinco mil anos antes de Cristo. Por isso dizemos que a História do Cinema começou há sete mil anos. O cinematógrafo e os irmãos Lumière Os irmãos Lumière iniciaram a comunicação por meio do cinema. Para que chegassem ao primeiro aparelho, o cinematógrafo, foi preciso que resolvessem três dificuldades: a análise do movimento, a fixação desse movimento num recipiente qualquer e a sua projeção fora do aparelho. Louis Lumière mostrou a sua invenção ao público na histórica sessão de 28 de dezembro de 1895, em Paris, realizando os primeiros espetáculos regulares de Cinema. Os irmãos Lumière, apresentando o seu cinematógrafo, tinham mais uma preocupação científica do que interesse artístico ou comercial.As cenas filmadas eram as da vida diária, sem nenhum artifício,espécie de "álbum de família" animado.Pelos títulos dos filmes podemos ter uma idéia: "A Saída das Usinas", "A Chegada do Trem" - filmes de 16 milímetros, com duração de 2 minutos. Aos poucos, entretanto, as perspectivas vão se ampliando. Lumière passa a filmar acontecimentos fora de casa: um congresso, um jubileu, uma exposição - atualidades cinematográficas de hoje! Envia seus auxiliares, os "caçadores de imagens", para o exterior, a fim de filmar acontecimentos históricos. Eis que os filmes vão aumentando de duração e passaram a contar histórias e a transmitir idéias. Lumière realizou ainda o primeiro filme de enredo, com os seguintes elementos: exposição do ambiente, motivos, personagens,intriga, clímax e desenlace. Na origem do cinema, já encontramos duas tendências: documentarista (informação) e composição de espetáculos (diversão). Nesse período, aliás, a maior tendência é para o teatro filmado. George Méliès, o mágico da tela George Méliès foi chamado "o mágico da tela". Diretor de uma casa de espetáculos, prestidigitador e ilusionista, viu logo as enormes possibilidades da câmera. Seguiu no princípio o exemplo de Lumière, mas começou a filmar todo o repertório do grande ilusionista Houdini, e se voltou definitivamente para o teatro, principalmente o gênero fantástico, o que hoje chamamos "ficção científica".Descobriu muitos truques cinematográficos.Seus filmes: "Viagem Através do Impossível", "Vinte Mil Léguas Submarinas", "Viagem à Lua", "A Conquista do Pólo", destacaram-se entre mais de 4 mil que realizou.Em 1908, porém, estava superado. O cinema deve muito a George Méliès.Foi ele quem introduziu o sonho, o feérico, partes integrantes da arte.Deu um impulso decisivo à arte cinematográfica,como criador de filmes de enredo; construiu o primeiro estúdio cinematográfico; foi o primeiro distribuidor de filmes. James Williamson Poucas pessoas sabem que o precursor dos filmes norte-americanos no gênero "western" ou "cow-boy" foi o cineasta inglês James Williamson, autor do primeiro filme com montagem alternada.Até aquela data, a câmera filmava uma ação contínua representada num palco ou uma ação qualquer no exterior. Os ingleses gostavam de filmar ao ar livre, o que os obrigou a interromper a ação. A montagem alternada apareceu pela primeira vez em "Ataque a uma Missão",quando vemos a ação em dois lugares diferentes, montadas alternadamente,para aumentar o "suspense" da história; a película inclui igualmente perseguições, correrias e galopadas, ações dotadas de conteúdo rítmico. Alfred Collins Alfred Collins, no seu filme "Casamento num Automóvel", usou pela primeira vez a "elipse", quer dizer, substituiu uma ação por um símbolo, ou o efeito de uma ação não filmada.Suprimiu toda uma cena de casamento na igreja,focalizando, apenas, a aliança no dedo dos nubentes. Esse fato nos mostra o quanto a imagem economiza cenas e palavras.Devemos valorizar, portanto, o próprio cinema mudo, que não consistia simplesmente de filmes desprovidos de som, como aconteceria se assistíssemos a um filme atual com o alto falante desligado.Os filmes mudos estariam mais perto da verdadeira arte cinematográfica do que algumas produções de hoje, que não sabem mais contar em imagens,baseando-se por demais na ajuda das palavras. A primeira arte cinematográfica Foi na Dinamarca que surgiu a primeira atriz cinematográfica do mundo, estrela autêntica, e não uma atriz teatral fazendo cinema.Em 1911 fundou-se naquele país a "Nordisk", cujo diretor, Urban Gad,compreendeu que a interpretação de um ator teatral apresentava características bem diversas da interpretação exigida de um ator cinematográfico.Sua esposa, Asta Nielsen, apoiava-se nos efeitos visuais da interpretação; com uma expressão mímica extraordinária, sabia alcançar um grau de expressividade única, nessa época do cinema mudo. O cinema atual e sua importância Agora que vivemos na era do cinema falado, os países exportam sua cultura também através de seus filmes e de seus diretores principais, cada um deles desejando transmitir a sua maneira de encarar o mundo ou uma determinada situação, enfim, todos trazendo uma mensagem. A máquina de filmar, portanto, age como instrumento de humanismo em nossos dias. O cineasta Federico Fellini O cineasta Federico Fellini nasceu no ano de 1920, em Rimini,Itália.Foi para Roma aos 16 anos de idade, tendo sido caricaturista e desenhista de ficção científica. Em 1943, casou-se com a atriz Giulietta Masina e, pouco depois, escreveu ou adaptou a história de vários filmes, destacando-se, ao lado de Rosselini, na película-chave do movimento neo-realista: "Roma,Cidade Aberta". Em 1950, de parceria com Rosselini, dirigiu "Mulheres e Luzes", o primeiro de uma série ininterrupta de grandes triunfos:"Abismo de um Sonho", "Na Estrada da Vida", "A Trapaça", "As Noites de Cabíria"."A Doce Vida", "Oito e Meio". A estréia de Fellini na direção ocorreu com o filme "Mulheres e Luzes", que retrata o pequeno drama de uma companhia teatral ambulante. Em 1954, "A Estrada da Vida" ganhou o segundo prêmio do Festival de Veneza, tendo no papel principal, de Gelsomina, sua esposa Giulietta Masina. O neo-realismo, condicionado pela guerra, que é um fato coletivo, inclinara-se sempre para os assuntos sociais. Fellini, sem recusar propriamente tal orientação, verifica que, terminada a guerra, a pessoa humana também existe e, tanto quanto o coletivo, o individual pode assumir relevância e verdade. Gelsomina, Zampano e "o louco" sofrem com a impossibilidade de se comunicar. Entretanto, todos trabalham, o que os socializa, porque lhes fornece uma natureza social;o trabalho os aproxima uns dos outros, unindo-os. Zampano era um homem animalizado,cuja força física triunfava sobre a pureza de Gelsomina e a inteligência de "o louco". Somente depois que fica só e decadente,começa sentir.A sentir e talvez a amar - nesse caminho, ele vai encontrar sua redenção como pessoa humana. Regressa à praia onde conhecera Gelsomina;ali, pela primeira vez, diante do mar e sob o céu, sofre e chora - não é mais um animal.O filme "La Strada" pode ser classificado como neo-realista porque a pessoa humana é uma realidade.Busca uma solução ética para o destino dos personagens;não compromete a realidade, antes completa e aprofunda os acontecimentos reais. Giulietta Masina foi também a grande intérprete de outro filme de seu marido - o não menos famoso "Noites de Cabíria". A prostituta que desejava ter uma família, que gostaria de dar amor e ternura, é terrivelmente iludida por aquele que parecia ser o instrumento de sua salvação.Os momentos finais de "Noites de Cabíria", todavia, mostra um caminho de esperança.Aquele sorriso de Cabíria, com o contínuo movimento da câmera em volta dos jovens que se divertem não foi só uma das mais belas cenas finais da história do cinema, porém um dos instantes decisivos da ideologia do nosso tempo, mostrado com a imediatidade objetiva da câmera cinematográfica: o desespero e o abandono podem ser superados pela capacidade humana de reviver e esperar dias melhores. Gelsomina e Cabíria destacaram-se como tipos cinematográficos - aparentemente marcados pela miséria e degradação, se nós nos detivermos para examiná-los em profundidade, aparecerão como portadores de poesia e riqueza interiores.A interpretação de Giulietta Masina, esposa de Federico Fellini, conseguiu transmitir aos espectadores a mensagem de cada personagem. Escreveu Irene Tavares de Sá, no livro "Eva e Seus Autores": "... encontramos em Cabíria os mais contraditórios sentimentos em estado puro: agressividade e espontaneidade, ao mesmo tempo que é generosa, digna e sincera.A esperança não a abandona por mais que o infortúnio a persiga. E embora tudo lhe tenha faltado na vida como proteção, não se degrada interiormente, continuando a esperar a felicidade no amor.Domina-a poderoso instinto de evasão e purificação em demanda de regiões inacessíveis.Apesar de todas as condições contrárias, Cabíria é um ser "moral" sempre buscando uma saída para a situação em que vive, dividida entre as contingências de uma dura realidade e as grandes aspirações espirituais:fé e amor. É um ser em luta, que não se entrega ao desespero nem à degradação. Nesse sentido há nesse admirável filme uma mensagem cristã que deixa perceber a oculta grandeza do ser humano. Para Cabíria, o amor é um valor idealizado, pelo qual ela dará todos os seus bens, como "o mercador que vendeu tudo que possuía" para comprar a mais bela das pérolas.Em sua contextura dramática, beirando muitas vezes o grotesco e o primitivo, há uma recôndita beleza e grandeza nos esforços de Cabíria por superar a adversidade e a miséria,como se o amor fosse nela uma força propulsora. E se o realismo de Fellini a conduz aos limites do desespero, nova esperança termina por surgir, à qual ela se agarra e adere como ao seu elemento natural". "Cabíria é um ser puro que vence a "fatalidade", descobrindo em si mesma novas energias.Secreta e misteriosa intuição parece conduzi-la e revelar-lhe o segredo dos valores supremos, embora revestidos da mais triste condição.E justamente porque o tom é poético e não dogmático, aceitamos seus contrastes como possíveis e conciliáveis, acabando por descobrir no fundo desse contraste a essência de um ser puro, não corrompido". Dirigindo e escrevendo o roteiro de seus filmes,Fellini tem se destacado no panorama do cinema contemporâneo."A doce Vida",por seu estilo próximo dos grandes afrescos, requisitou uma concentração visual e lógica; reflete a intenção crítica "felliniana" sobre a sociedade atual.Existe uma necessidade moral subjacente nesse longo "documentário" da perdição de nosso tempo.Exatamente porque nenhum personagem se apresenta positivo, permanece no espectador o sentimento básico de se opor à doce vida amargamente retratada.No Festival de Cannes de 1960, quando "A Doce Vida" conquistou a Palma de Ouro, Fellini declarou numa entrevista à imprensa:"Eu quis fazer um filme que transmitisse coragem, na medida em que ele faz olhar a realidade com uma visão nova, sem se deixar envolver pelos mitos,as superstições, a baixa cultura, os sentimentalismos.Eu desejaria que não se considerasse o filme como pessimista, desesperado e satírico, porém, que meus amigos dissessem: "É um filme leal". Lembremos que o desfecho de "A Doce Vida" é o primeiro plano de uma cândida adolescente, num simbolismo marcante de pureza.Esse ideal de Fellini está presente em "Oito e Meio", bem como em "Noites de Cabíria" e "A Estrada da Vida", embora em vestes diversas.Nas lentes do cinema, Fellini e sua esposa Giulietta Masina transmitem ao mundo as mensagens de que são portadores. (do livro “O progresso das comunicações diminui a solidão humana? Uma interpretação histórica das comunicações gráficas e audiovisuais, desde a Pré-História até o Intelsat” – de Theresa Catharina de Góes Campos. Editora Lidador, 1970). |