TUDO PLANEJADO

Diário de Pernambuco - 10/7/2003

TUDO PLANEJADO

Todos os prefeitos do Recife se afogam nos alagamentos anuais dos meses de chuva, bastando as nuvens se desmilingüirem por meros 30 minutos. Os que deixam de ser reeleitos lavam a alma sabendo que o adversário vencedor vai se atolar no inverno seguinte. Pode ser pêfêlê, pêtê, pêquepê e até prestar bons serviços noutros setores. No setor pluvial, os gestores municipais entram pelo cano, dão com os burros n’água – e bote água nisso. Entra ano, sai ano e a cidade se desmantela toda em inundações agudas e crônicas, agravadas por uma população deseducada, que joga lixo em toda parte, entupindo bueiros. E por mal supervisionados funcionários da limpeza pública, que agravam os entupimentos empilhando areia e gravetos varridos bem perto das grades por onde a água deveria escorrer. Sem falar na falta de renovação profunda da secular rede de esgotos, carente de potencial de marketing porque não se vê.

Matutando sobre a regularidade infalível dos transtornos que enfrentamos enquanto pedestres, passageiros e motoristas, toda vez que chove, comecei a desconfiar de que os alagamentos são planejados. Essas inundações sazonais só podem fazer parte de algum plano diretor ou política pública, implementada com eficiência suprapartidária, cuja meta é encher as ruas de águas não escoadas, com o apoio do Fundo Pluviométrico Mundial.

Planejar significa preparar-se para um objetivo, seguindo roteiro e método, que incluem certas ações e excluem outras, a fim de se chegar a determinados resultados. A deseducação dos cidadãos para administrar seu próprio lixo é um dos ingredientes do plano. A fiscalização deficiente de obras públicas que tenham impacto direto no escoamento de águas, também se encaixa no plano.

E não é somente o Plano Municipal de Alagamentos do Recife. Tudo, em nossa História, aponta para a existência de planos estaduais e federais que utilizam a deseducação, a má fiscalização e a moleza de sanções como roteiro e método, de resultado garantido: o estado de coisas da nossa vida brasileira. Observando a reincidência de fatos, caiu a ficha: temos um Plano Nacional de Subdesenvolvimento, cujas metas estão sendo bem cumpridas: cidades incivilizadas, violência a cada esquina, desperdício em diversos setores da produção, doenças evitáveis com educação e infra-estrutura, paliativos e corretivos em vez de prevenção, sempre que rendam maiores dividendos eleitorais. Tudo planejado.

Segundo Nelson Rodrigues, o subdesenvolvimento não se improvisa. Alagamentos e epidemias, o aumento da população de assaltantes e seqüestradores, uma escolaridade fajuta que empulha os mais pobres, a atuação da mídia eletrônica, deformando em vez de formar, a falta de dinheiro para umas coisas e dinheiro de sobra para outras, tudo isto tem carga genética, gestação, crescimento. Como diria o Barão de Itararé, “as conseqüências vêm depois”. terezahalliday@yahoo.com

Tereza Lúcia Halliday, Ph.D

Criação, Análise e Assessoria de Textos

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"Palavra quando acesa, não queima em vão".

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