Diploma
volta a valer para o exercício do jornalismo
O diploma voltou a
valer para o exercício do jornalismo. A juíza federal, Alda
Basto, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
suspendeu a sentença que dispensou a obrigatoriedade do curso
superior. Para ela, a concessão de registro precário de
jornalista "sem qualquer restrição" gera
"titulares de ilusão".
O
pedido foi feito pela Federação Nacional dos Jornalistas
(Fenaj), representada pelo advogado João Roberto Egydio Piza
Fontes. Com a decisão, os registros precários obtidos por
diversos profissionais liberais não valem mais. Ainda cabe
recurso.
"Preocupam-nos
como ficarão os milhares de jovens que lucrarem obter a Carteira
de Jornalistas, em virtude da sentença de primeiro grau e
conseguirem emprego, pois amanhã podem tudo perder", afirmou
Alda Basto. A juíza liberou a Fenaj da multa de R$ 10 mil pelas
carteiras de jornalista que emitiu com tratamento diferenciado dos
diplomados.
O
procurador André de Carvalho Ramos, que entrou com a ação civil
pública para a dispensa do diploma de jornalista, foi procurado
pela revista Consultor Jurídico para comentar a decisão,
mas está em férias.
Débora
Pinho é editora-chefe da
Revista Consultor Jurídico
Leia a decisão:
PROC:
2003.03.00.042570-8 AG 183911
ORIG: 200161000259463/SP
AGRTE: FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS FENAJ e outro
ADV: JOÃO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES
AGRDO: Ministério Público Federal
PROC: ANDRÉ DE CARVALHO RAMOS (Int. Pessoal)
AGRDO: SINDICATO DAS EMPRESAS DE RÁDIO E TELEVISÃO NO ESTADO DE
SÃO PAULO SERTESP
ADV: RUBENS AUGUSTO CAMARGO DE MORAES
PARTE R: União Federal
ADV: ANTÔNIO LEVI MENDES
ORIGEM: JUÍZO FEDERAL DA 16 VARA DE SÃO PAULO Sec Jud SP
RELATOR: JUIZ CONV. MANOEL ÁLVARES/ QUARTA TURMA
DECISÃO
Vistos, em
Turma de Férias.
Agrava
a Federação Nacional dos Jornalistas e Sindicato dos Jornalistas
Profissionais no Estado de São Paulo contra a decisão proferida
em Ação Civil Pública, que recebeu a apelação da sentença,
de parcial procedência, apenas no efeito devolutivo, confirmado e
estendendo os efeitos da tutela, com caráter satisfativo,
alegando descumprimento da sentença e imputando multa de R$
10.000,00 ao agravante se emitir Carteira Nacional de Identidade
de Jornalista com tratamento diferenciado daqueles feitos por
jornalistas diplomados.
Explica
o agravante que após proferir a sentença a magistrada houve por
abrir vista ao Ministério Público para que este se manifestasse
quanto à notícia de que a agravante FENAJ se recusara a emitir
carteiras de identidade e teria publicado lista no jornal da
entidade com os nomes dos beneficiários da decisão judicial. A
FENAJ intimada alegou que não há comando na sentença para tal
cumprimento. A magistrada preferiu, então, decisão, em se
referindo ao art. 4º da Lei nº 7.084/1982 quanto à obrigação
da FENAJ de expedir carteiras de identificação, aduzindo
descumprimento da sentença porque a sentença na ação civil pública
pode obrigar terceiros não-participes, vinculando o assistente
simples.
Discorrendo
sobre o perigo de grave lesão e de difícil reparação, na
possibilidade de qualquer pessoa e sem qualquer formação exercer
a atividade de jornalismo, em detrimento de todos os profissionais
formados em curso superior, acarretar prejuízos irreparáveis a
pessoas inocentes sem se assenhorar das conseqüências que as
pessoas, requer suspensivo da decisão agravada, afastando-se a
incidência da multa e que seja recebida sua apelação no duplo
efeito.
Decido.
Na
análise do expendido verifico serem dois os pedidos do agravante,
quais sejam, atribuir-se o duplo efeito à apelação interposta
e, suspender a decisão proferida após a sentença, que criou um
"extensão" do dispositivo sentencial,
"condenando-o" em obrigação de não fazer e de fazer,
sob pena de multa de R$ 10.000,00 ao fundamento de que na ação
civil pública a sentença opera efeitos a terceiros que não são
réus.
Importante
se sumariar os acontecimentos principais. A ação civil pública
foi proposta exclusivamente contra a União Federal e, foi
deferida tutela antecipada determinando à ré, em todo o país, não
mais exigir diploma de curso superior em Jornalismo quando do
registro no Ministério do Trabalho para exercício da atividade
de jornalista, informando aos interessados a desnecessidade de
apresentação de tal diploma, bem como não executar fiscalização
ou aplicar autuações, sob pena de multa diária. Proferida a
sentença o dispositivo final concluiu por julgar parcialmente
procedente o pedido e na condenação manteve os mesmos ditames da
tutela e, acresceu a declaração de nulidade de todos os autos de
infração pendentes de execução e a expedição de ofício aos
Tribunais de Justiça dos Estados, para trancamento de inquéritos
ou ações penais por exercício ilegal do jornalismo. Fixou a
multa contra a União em R$ 10.000,00 em eventual descumprimento.
Percebo
que nem a exordial, nem a tutela nem a sentença fazem qualquer
menção ao agravante.
Contudo,
após sentenciar, a magistrada sem indicar o sustentáculo legal,
abriu vista ao Ministério Público Federal para se manifestar
sobre a conduta do agravante, intimando também esta última a se
manifestar. Após, referindo-se ao art. 4º da Lei nº 7.084/1982,
proferiu decisão condenando a FENAJ a emitir Carteira Nacional de
Jornalista sem qualquer restrição aos beneficiados pela sentença,
determinando ao Sindicato dos Jornalistas o mesmo procedimento.
Primeiramente
é de se frisar que a "sentença" da ação civil pública
não tem força de lei em relação a terceiros que não
integraram o pólo passivo, porque o comando judicial não atinge
pessoas que não são réus na lide coletiva, mesmo porque sequer
lhes foi dado o direito de defesa ou do contraditório. Os
"efeitos erga omnes ou "ultra partes" a que se
refere o art. 16 da Lei 7.347/1985, significa estar inibida a
repropositura de ação com o mesmo pedido nos limites da competência
territorial do órgão prolator, bem como, que a condenação genérica
beneficia todos os indivíduos na mesma situação jurídica,
embora não tenham integrado a lide.
Como
o agravante não é réu, não está sujeito ao comando da sentença,
que sequer lhe faz menção. Neste aspecto, portanto, merece
exclusão os comandos direcionados ao agravante.
Outrossim,
cumpre registrar que proferida a sentença, publicada na mão do
escrivão, o juiz cumpre e encerra o ofício jurisdicional,
cessando sua competência para decidir qualquer questão
relacionada com a coisa julgada. Neste sentido:
"Decisão
em que o juiz acrescenta novo dispositivo a sentença já
publicada. Tal decisão não é ato judicial, pois o magistrado já
exaurira e acabara sua prestação jurisdição (C.P.C. art.
463)". STJ-RT 699/173.
Em
assim sendo, a decisão agravada não tem existência jurídica,
por inadmissível perante a lei processual civil, donde, também
por este aspecto merecer reparo.
Ademais,
a decisão agravada concede pedido não contido na exordial,
caracterizando-se como "extra petita". O juiz não pode
antecipar tutela que a sentença não outorgou e estranha ao
pedido exordial formulado (RT 737/365).
Nestes
aspectos, portanto, vislumbro razão ao agravante.
Por
outro lado, a decisão agravada recebeu a apelação do agravante
apenas no efeito devolutivo, com base no art. 520 inc. VII do Código
de Processo Civil.
A
regra geral na ação civil pública no tocante à apelação é o
efeito devolutivo, para autorizar o resultado útil do processo,
permitindo a execução provisória. Neste sentido o art. 273 parágrafo
3º do Código de Processo Civil prescreve que a efetivação da
tutela antecipada observará, no que couber o conforme sua
natureza, as normas previstas nos arts. 500, 461 parágrafos 4º e
5º, e 461-A.
Deste
modo, corre por conta do exeqüente reparar prejuízos causados e
necessária será a prestação de caução se a execução deter
caráter irreversível e cause grave dano.
No
caso em comento, a condenação prevê procedimentos satisfatórios,
extintivos de direito de autuação fiscal e até penais, todos
com caráter de definitividade, com o que determinar se expeçam
Carteiras de Jornalista sem qualquer restrição, sem se apor caráter
precário da concessão, conduta que não corresponde à
realidade. Criam-se titulares de ilusão. A situação jurídica
dos beneficiados é provisória e precária, posto que a matéria
está "subjudice", podendo ser revertida a qualquer
momento.
Num
futuro é possível que aqueles que não têm diploma universitário
possam ser jornalistas, se a presente ação for confirmada nos
recursos à segunda instância do Judiciário, mas esta não é a
realidade de hoje. Preocupam-nos como ficarão os milhares de
jovens que lograrem obter a Carteira de Jornalistas, em virtude da
sentença de primeiro grau e conseguirem emprego, pois, amanhã,
podem tudo perder.
Os danos a
advir do cumprimento imediato serão irreversíveis.
Ressalvo
que não se cuida na hipótese de dano imediato, mas de discussão
do exercício de atividade profissional, na qual se aponta
ilegalidade de Decreto-lei que tem 34 anos de vida no ordenamento
jurídico, sem qualquer admoestação, motivo pelo qual não
contemplo qualquer dano ao aguardo da decisão transitada em
julgado nos Tribunais.
Diante
de todos estes argumentos, DEFIRO efeito suspensivo aos itens 1, 2
e 4 da decisão agravada e na forma do artigo 14 da Lei n.º
7.347/1885 recebo a apelação no duplo efeito.
Comunique-se
ao juízo "a quo".
Cumpra-se o
artigo 527 inciso V do C.P.C.
Publique-se
São Paulo,
23 de julho de 2003.
ALDA BASTO
Desembargadora Federal
Turma de Férias