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Teatro Caleidoscópio-Brasília |
STRIPTEASE Ei, E-companheiros, O Teatro Caleidoscópio, que fica no Sudoeste, está com belo espetáculo em cartaz. É a peça SRIPTEASE, do polonês, Slavomir Mrozek, que se filia à corrente do teatro do absurdo, lançado nos anos sessenta, pelo romeno, radicado em Paris, Eugène Ionesco, figura simpática e bem humorada, que conheci durante palestra realizada na UnB. Originário, portanto, dos países dominados pela extinta União Soviética, o teatro do absurdo se sustenta no recurso da metáfora, isto é, do sentido figurado das palavras, para criar situações irônicas – à influencia da filosofia de Kierkegaard – sobre fatos que os autores não podiam dramatizar ante as injunções politicas em que viviam. Foi esse recurso que usei também ao escrever, nos anos de ditadura militar, meu poema, “Elegia ao Chapéu”, premiado em São Paulo. Na peça de Ionesco “Jacques ou a Submissao” – talvez uma das mais didáticas do receituário do absurdo – toda a família se concentra em torno do filho mais velho, Jacques, para pressioná-lo, por exemplo, a comer batata doce. À luz desse tema tiram-se ilações as mais diversas sobre o autoritarismo que se exerce, tanto no âmbito familiar, como na esfera politico-social, numa linha de ironia e humor, sem resvalar, contudo, para o escrachado besteirol, de origem americana, usado na televisão. Eis por que, diante do mundo globalizado em que vivemos, cada vez mais totalitário, o receituário do teatro do absurdo continua na ordem do dia, mobilizando opiniões dos aficionados de um teatro de gosto mais apurado. Em STRIPTEASE, Mrozek repete mais ou menos, sem profundidade porem, o que fez Honoré de Balzac no seu romance “As Grandes Ilusoes”, criando dois personagens, que refletem sua própria personalidade. Ele se “despe”, portanto, em cena, expondo como reagem seus lados masculino e feminino diante de circunstâncias político-impeditivas das aspirações libertárias. Melhor dizendo, da aspiração ao direito individual da livre escolha. Enquanto os personagens de Balzac se encontram, pela primeira vez, numa biblioteca, os do dramaturgo polonês se conhecem num logradouro publico depois de realizarem ambos viagem no mesmo trem no percurso entre duas cidades, que se denominam SLAVOMIR e MROZEK, nome e sobrenome do autor. Ambos procuram o mesmo endereço numa denominada rua Beckett – homenagem ao mais badalado autor do teatro do absurdo – e daí, as coincidências vão se marcando e se acentuando de forma que a platéia, ao mesmo tempo em que se diverte com as confusões criadas na busca da identidade dos dois, não deixa também de perceber que, se o lado feminino do autor é mais intuitivo, atirado e exasperado, o lado masculino é conservador, prudente, acomodado e acovardado. Como o texto de Mrozek é curto, os criadores do espetáculo do Teatro Caleidoscópio, para reforçar suas características, decidiram enxertá-lo - no que fizeram bem - com trechos de outras peças do mesmo naipe, como “A Cantora Careca”, de Eugène Ionesco, “Esta Noite Juntos Amando-nos Tanto”, de Maruxa Vilalta, “Ida ao Teatro”, de Karl Valentin, “Dias Felizes”, de Samuel Beckett e “Max e Claire”, de Marcelo Perrone. Assim tem-se espetáculo de mediana duração, o que parece pouco, entretanto, diante de suas reais qualidades. A primeira delas, é a direção de Julio Cruccioli, que consegue equacionar de maneira notável o pequeno, mas aconchegante espaço do teatro, tirando proveito principalmente de um painel espelhado ao fundo do palco, no qual se reproduz e se efetiva o momento mais belo e poético do espetáculo. As interpretações de André Amaro e Fabiana Tenório valem muitos aplausos porque além de responderem ambos às pontuações da direção, consegue cada um deles imprimir tom bastante pessoal aos personagens que interpretam. Tudo o mais – figurino, cenário, sonoplastia, adereços, iluminação e material gráfico – é de excelente qualidade. Eis, portanto, um espetáculo que merece ser visto por todos os que gostam de prestigiar o teatro que se faz em nossa cidade. REYNALDO DOMINGOS FERREIRA |