Autor do livro-reportagem Camaradas, jornalista diz que o
mito romântico da revolucionária nasceu de propaganda
Profissão: Jornalista, é correspondente da Rede Globo em
Nova York
Experiência: Cobriu oito guerras, entre elas a do Golfo, e
morou em Berlim
ÉPOCA - Que Olga você conheceu em suas pesquisas?
William Waack - Uma profissional do serviço secreto militar
soviético, treinada para obedecer em qualquer circunstância,
sem jamais duvidar dos chefes e da linha estabelecida pelo
Partido, disciplinada, mas sem interesse por assuntos
teóricos, que ao chegar ao Brasil perdeu o foco da missão.
O trágico em Olga é que ela não tinha saída.
ÉPOCA - Como assim?
Waack - A verdadeira dimensão trágica da figura de Olga é o
fato de ela ter sido vítima de dois totalitarismos. Foi
liquidada por um deles, o nazista, enquanto todos os seus
companheiros de luta no Brasil, que sobreviveram à aventura
de Prestes e conseguiram voltar a Moscou, foram destruídos
pelo outro totalitarismo, o comunista - foram executados na
Rússia antes ainda do assassinato de Olga. Mas não era um
aspecto que interessava à máquina propagandística do PC da
Alemanha Oriental, que iniciou o culto ao mito de Olga no
final da década de 50, suprimindo partes de sua real
história. O mesmo ocorreu no livro lançado no Brasil por
Fernando Morais, que, na verdade, tem boa parte compilada da
primeira biografia de Olga feita pela alemã Ruth Werner, a
pedido do PC alemão, em 1962. Trabalhos que não contam a
realidade.
ÉPOCA - Pelo que pesquisou, do que mais não se fala?
Waack - Um detalhe fundamental: o fato de que a mãe de
Prestes pediu várias vezes às autoridades soviéticas que
tentassem trocar Olga por prisioneiros dos soviéticos. Era
impossível que isso acontecesse, pois, naquele momento,
pouco antes da Segunda Guerra Mundial, os soviéticos estavam
entregando à Gestapo militantes alemães que se refugiaram em
Moscou. Uma dessas pessoas, aliás, foi a última a ver Olga
viva no campo de concentração. Era Margareth Buber-Neuman,
uma colega dela de militância, alemã e judia, que chegou a
ser preparada para ir ao Brasil, mas foi presa com o marido
em Moscou e entregue à Gestapo.
ÉPOCA - Isso tira de Olga e Prestes o romantismo, a luta
por ideais?
Waack - Prestes e Olga eram, antes de mais nada, soldados
do Partido, e a esses soldados não se admitiam crises de
consciência. Dou um exemplo: entre a derrota do levante de
novembro de 1935 e a prisão dos dois, no início de 1936,
Prestes mandou matar a namorada do secretário-geral do PCB,
Elza, uma moça inocente e ingênua de 18 anos, que foi
estrangulada por militantes do partido. Ele suspeitava,
erroneamente, que Elza fosse informante da polícia. E Olga
não se opôs à decisão, segundo o agente soviético no Rio que
chefiava o esquema clandestino. Não havia nada de romântico
ali.