Uma
Sexta-Feira de Abril no Campo
04:36
Na varanda de madeira do primeiro andar, ainda
escuro,
ouço a chuva leve, ainda longe, em tons suaves.
Um minuto depois a chuva alcança nosso chão,
sem vento, como um enorme cobertor sonoro,
delicado, líquido, perene.
Ouço agora o som das pingueiras, cadenciado,
enquanto diminui o barulho da chuva.
Vem o som dos pingos,
contraponto, em segundo plano,
misturando-se à aceleração e desaceleração desta
chuva de madrugada,
que me faz sentir parte da natureza
Nada substitui esta experiência primeira do viver,
que sempre foi assim
e assim
sempre será.
Comungo com meus antepassados
nos engenhos, nos sítios, neste solo.
Antepassados nativos, negros, europeus
e outros mais que não conheci
mas que intuo agora.
04:56, a chuva pára.
Ouço poucos pingos, a intervalos maiores,
misturados com sons de galos de vizinhanças longínquas,
em mais de uma direção.
Agora o som oco de uma pequeno objeto batendo na
telha.
Um pássaro (ou morcego) em vôo
deixou cair alguma semente
pois não existe viv’alma ao redor.
Passarinhos começam timidamente a cantar,
misturando-se com o chiado continuado, ainda
comedido,
de duas cigarras.
21
de Abril de 2000
Paulo
Gileno Cysneiros
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